O Animismo na Umbanda

Texto de Caio Cassola

Muito se confunde entre os umbandistas quando o assunto é incorporação, e muitos medos surgem durante o seu período de desenvolvimento das faculdades mediúnicas, sejam estes medos gerados por falta de conhecimento, ou mesmo por mitos ou preconceitos oriundos de pessoas de outras correntes religiosas. Mas um desses medos ou mitos que se destacam entre os iniciantes é o animismo.

Mas o que seria o animismo e como poderíamos abordá-lo em ambiente umbandista, sem que este assunto venha a se tornar um tabu ou dogma religioso? Vamos começar a entender um pouco mais deste processo.

Segundo o estudo de antropologia da religião o animismo seria a sua forma mais primitiva de cosmovisão, onde seres não humanos como plantas, animais, fenômenos da natureza, entre outros, possuem uma essência espiritual. O termo deriva do latim animus, que significa alma, vida. É considerado o sistema religioso de alguns povos tribais indígenas, especialmente as de antes do desenvolvimento das religiões organizadas.

No espiritismo, o animismo é considerado um fenômeno produzido involuntariamente pelo próprio médium encarnado, que durante uma sessão não estaria necessariamente manifestando uma entidade ou espírito, mas tão somente a expansão de seu perispírito e de sua alma.

A Umbanda não discorda de nenhuma dessas explicações. Mas como a Umbanda é uma religião completa em si, cabe aos umbandistas discorrerem sobre este tema que gera dúvidas e receios em muitos, justamente pelo fato de o animismo ser mal visto pelos espíritas, e também mau compreendido por parte de médiuns de Umbanda.

Então, entendendo que a incorporação de um espírito é a manifestação plena de uma entidade espiritual em um corpo físico, onde esta entidade assume as ações do corpo físico em comum acordo com o seu médium, o animismo seria uma não manifestação plena, ou talvez só parcial, onde existe uma manifestação mediúnica, porém com intervenções do próprio médium durante o processo. Seria como se o médium não abrisse mão do controle do próprio corpo na incorporação, e com isso suprimisse a manifestação, projetando seus desejos íntimos de forma a sobrepor a real manifestação mediúnica.

Para que fique melhor entendido, imaginem um médium recém chegado a religião, que ainda está desenvolvendo a sua mediunidade dentro de um terreiro. Por algum tempo este médium observou toda a corrente mediúnica trabalhar incorporando os guias espirituais, e assim este foi averiguando como isso transcorria de forma física. Quando enfim chega a hora deste médium começar a trabalhar incorporado com os seus guias, por já ter gravado em sua memória a forma de incorporação que os médiuns mais antigos tinham, e principalmente a do seu dirigente espiritual, ele automaticamente cria um bloqueio mental onde ele entende que “esta é a forma certa, igual ao dos médiuns antigos e do dirigente”, e dessa forma acaba bloqueando parcialmente a manifestação de seu guia, passando a frente em sua forma de manifestação.

Entendemos que o guia espiritual está presente junto a esse médium, porém este ainda não está plenamente manifestado, pois o que assumiu a forma na manifestação foi somente o padrão já instalado no mental do médium. E isso é o que distingue o animismo da mistificação.

Mas há também um processo mais danoso e desequilibrado de animismo, que é quando na manifestação dos guias espirituais o médium potencializa os trejeitos dos guias na intenção de aparentar maior força e potência. Isso ocorre quando o emocional do médium está em desequilíbrio, e sem uma doutrinação correta de como deve transcorrer todo o processo de incorporação, acaba por projetar na mesma todos os seus excessos.

Como exemplo, imagine um médium recém chegado a um terreiro, que ainda tem muito medo de incorporar, mas que também é arrogante e prepotente em alguns momentos. Por carregar estes sentimentos, na hora da manifestação mediúnica esses excessos serão colocados pra fora, de forma que a incorporação será exagerada e desequilibrada.

É comum vermos médiuns mais antigos dizerem com ar de arrogância que o “seu” preto-velho é muito velho, muitíssimo velho, e que por isso em sua incorporação ele “vem” quase se arrastando de tão devagar e de tão curvado. Tenham a certeza que de esse excesso de curvatura e de vagarosidade nos passos não passa de um processo anímico, onde a arrogância e a prepotência deste médium é tamanha que acaba por “tomar a frente” do próprio guia espiritual na manifestação mediúnica, agindo como se a manifestação fosse extremamente difícil por se tratar de um espírito tão velho, quando que na verdade a entidade não precisa desse tipo de trejeito excessivo e desgastante.

Ver em uma gira de esquerda os senhores Exus incorporados rindo sem parar, falando palavras chulas e ofensivas, ou as senhoras Pombagiras incorporadas gargalhando de forma exagerada e agindo de forma promíscua, tenha certeza de que todos estes comportamentos não passam de processos anímicos, onde os médiuns já tem em seus íntimos que os Exus negativos e sem educação, e que as Pombagiras são levianas e atrevidas. Como estão enganados estes médiuns, que colocam os seus desejos a frente das manifestações espirituais.

Concluindo, o animismo na Umbanda é a manifestação do desejo do médium a frente do seu guia espiritual, onde assim atravessa o processo de incorporação colocando seus desejos em evidência. Ele pode ser algo sutil, ou mesmo ser a válvula de escape dos sentimentos negativos e dos desejos reprimidos.

Todo o médium umbandista deve se atentar ao seu emocional, procurar manter o equilíbrio em sua vida e sempre refletir sobre suas ações, mesmo que aparentemente sejam benéficas. E principalmente nos trabalhos espirituais, a incorporação deve ser um ato de entrega, de abertura para que uma entidade superior utilize nossa matéria para o nosso bem, para o nosso aprendizado e para o auxílio de todos.